I. SERIA UMA CARNIFICINA
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Esta pequena comédia foi-nos contada pelo então desembargador R. Abreu (só o indico assim para que meio se revele, meio se esconda o dono da história) e se deu com ele, quando juiz de Vara Criminal de Niterói.
Não me lembram mais os detalhes por que fora parar em sua sala cidadão que ameaçava matar a mulher por traição, segundo o próprio ameaçante.
O oficial da lei que conduziu o presunçoso futuro uxoricida chegou muito preocupado ao gabinete dele, dizendo da iminência do crime.
Dr. R. Abreu, homem direto no que fazia, ouviu o relato do policial e, dirigindo-se ao marido traído, chamou-o à janela aberta sobre a Avenida Amaral Peixoto, com intenso movimento àquela hora, e lhe disse:
- Olhe só quanta gente na rua! Quantos aí o senhor acha que são traídos? Muitos, não é? Agora, imagine: se cada corno resolvesse dar um tiro na mulher, isso ia virar uma carnificina. Ia virar festa de São João de tanto tiro! O senhor pensa que é o único corno da cidade? Do mundo? E, depois, mata a mulher, vai preso e condenado, e acaba com sua vida. Pense bem! Agora, se quiser mesmo levar adiante essa ideia ridícula, tome aqui o meu revólver e vai lá: dê um tiro nela, que eu mando a polícia pegá-lo até nos confins do inferno e o meto no xadrez.
Com um argumento irrefutável desses, o homem se recolheu à sua insignificornância, deu o dito pelo não dito, o prometido pelo arrependido, e saiu do gabinete do resoluto magistrado, carregando a traição que lhe pesava sobre a cabeça. Ele, de fato, era apenas mais um número numa estatística que nunca para de crescer.
II. O SENHOR CASOU, ESTAMOS CASADOS!
O Dr. Abeylard Gomes era juiz do cível em Duque de Caxias, lá pela década de sessenta. Dentre suas incumbências, estava a de realizar casamentos. Hoje isso é feito por juiz de paz.
Contou-nos ele, certa feita, que realizou um casamento, dentro dos preceitos legais, com as testemunhas indicadas e os convivas de praxe, numa sexta-feira.
Na segunda-feira seguinte, chegou-lhe alguém para informar que ele tinha oficializado o casamento de dois homens: a noiva atendia pelo nome de Diocleciano, como veio a saber depois, e não Marizete, como estava nos assentamentos do cartório.
Assustado com a denúncia, determinou ao oficial de justiça que se dirigisse ao endereço do casal e trouxesse os dois rapazes à sua presença. O representante do juiz encontrou a casa fechada: tinham os pombinhos partido em lua de mel, segundo os vizinhos. Sem alternativa, deixou recado para que comparecessem, tão logo voltassem, ao fórum da cidade.
Cerca de dez/doze dias depois, aparecem os dois diante do Dr. Abeylard. Com calma e paciência que lhe eram características, o juiz explica-lhes que o casamento não existira, porque "eivado de nulidade", havia um erro de pessoa, mais ou menos isso: a lei brasileira não previa (e não prevê até hoje) casamento entre iguais. Assim o ato era “nulo de pleno direito”, conforme o jargão judiciário, não existiu. Tanto que mandara o escrivão anular o registro no livro de casamentos.
Depois de certo tempo em que o magistrado, com toda a clareza e todos os pormenores jurídicos, explicou-lhes que não houvera casamento, a noiva virou-se para ele, toda cheia de dengos, e disse:
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E se retiraram pouco depois, sem a certidão, mas com a convicção de que realmente estavam casados. E, melhor, por um juiz de direito!
Deve ter sido o primeiro e único casamento gay do Brasil a passar por um fórum judicial.
Em matéria de cornância o sujeito pode até perder a esportiva mas, nunca, nunca deve perder o humor. Tanto é assim que os ingleses dedicaram uma parte do reino unido ao povo córnico: a céltica Cornualha. Ah, obrigado pela palavra nova no meu vocabulário: uxoricida. Realmente, um nome muito feio.
ResponderExcluirImpagável, as duas. Mas a do corno é para ir para os anais da cornice mundial.
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