31 de março de 2022

ESTAÇÕES HUMANAS

Apontem-me verões 
que não exsudei
invernos que não tiritei 
outonos 
que não frutifiquei 
primaveras 
que não floresci 

Apontem-me estações do ano
que não vivi 
até chegar aqui 
onde estou agora 
a bagagem plena 
à espera da lua minguante 
no derradeiro pôr do sol 
da definitiva primavera.

Pôr do sol em Itaipu (foto do autor).


16 de março de 2022

CÉU DE ESTRELAS

A boca da noite 
Do Rio de Janeiro 
Não tem dentes 
Não tem língua 
Tem assalto e morte 
E a vida não é um palco iluminado 
Veste-se de desenredo 

As estrelas pipocam no céu 
Da meia-noite 
Em rajadas 
Traçantes 
Certeiras 
Até encontrarem um peito 
Desavisado 
Um coração sorrateiro 

A boca da noite 
Do Rio de Janeiro 
Tem o hálito pútrido 
Do medo 
Da violência 
Da bomba 
Do tiroteio 

“E hoje 
Quando do sol a claridade” 
Abrasa os olhos 
Tenho saudades 
Da pomba-rola que voou 
No imemorial céu 
Estrelado 
Do Rio de Janeiro. 

Pomba-rola (em mercadolivro.com.br).


 (Versos incidentais e citações de Chão de estrelas, de Orestes Barbosa e Sílvio Caldas.)

4 de março de 2022

PROMESSAS E DESPEDIDA

Vou estender a luz do sol
Até a borda do teu riso 
Juntar meu siso ao teu juízo 
E a esperança verde e o vaga-lume 
No mesmo projeto onírico 
Que nos une. 
Vou contornar com o luar brejeiro 
Dos céus de junho 
Estes teus olhos sertanejos 
Abrir nosso peito distraído 
Para o futuro feito de desejos 
De coisas tão banais 
E sucumbir após exíguo prazo 
Deixar de estreitar-te em abraços 
Ouvir-te o choro doloroso 
Dizer adeus para nunca mais.

                                                Pôr do sol no Gragoatá (foto do autor).