Dia desses, meus dois netinhos vieram passar um dia conosco em Niterói. Moram eles, atualmente, na Barra da Tijuca, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Preparávamos para levá-los de volta para sua casa. Gabriela (seis anos) e Bruno (dois anos), já prontinhos, aguardavam que terminássemos de juntar a tralha que crianças costumam atrair consigo, quando saem.
No quarto que fora de seu pai, ainda assim identificado em casa, Gabriela desenhava algumas das ideias maravilhosas que as crianças têm, e seu irmão, muito concentrado, mexia em seus brinquedos.
Cheguei para Gabriela e lhe disse:
- Gabi, escute aqui o que vou dizer.
Percebi que o minúsculo irmão também se interessou em ouvir. Avós, às vezes, têm declarações importantes a fazer. Nunca se sabe!
E disse o seguinte:
Um dia vestido
De saudade viva
Faz ressuscitar
Casas mal vividas
Camas repartidas
Faz-se revelar
De saudade viva
Faz ressuscitar
Casas mal vividas
Camas repartidas
Faz-se revelar
Quando a gente tenta
De toda maneira
Dele se guardar
Sentimento ilhado
Morto, amordaçado
Volta a incomodar.
De toda maneira
Dele se guardar
Sentimento ilhado
Morto, amordaçado
Volta a incomodar.
Ela me olhou com seus lindos olhos negros arregalados e, incrédula, perguntou, sem entender bulhufas:
- O quê?!
Com dicção mais clara e ritmo mais lento, repeti o texto da canção de Clodô e Clésio, gravada por Fagner em seu disco Eu canto (Quem viver chorará), 1978, CBS.
Ao final do bis, mais falado do que declamado, ela insistiu:
- Vovô, você inventou isso?!
- Não, Gabi! Isto é a letra de uma música muito bonita. – E cantei a música para eles.
Ainda incrédula, ela duvidou de que fosse verdade. Achou que tudo fosse invenção de avô, esse ser velhinho capaz de tramar histórias mirabolantes, apenas para entreter netinhos. E é justamente, nesses momentos, que os avós aproveitam para dizer para seus netos que eles jamais os enganarão; que jamais mentirão para eles; que eles, os netinhos, podem sempre acreditar no vovô e na vovó. Notei, então, naquele instante, que Bruno também ficou muito impressionado com o espavento todo que armei.
Dito isso, desafiei-os a ir até a sala, onde está o sistema de som, e lá coloquei o cd em que se gravou a música. Quis provar-lhes que não sou mentiroso.
Operou-se um milagre que a música é capaz de fazer. Eles gostaram tanto, sobretudo o Bruno, o mais pivetinho, que tive de repeti-la algumas vezes antes de sairmos e, por fim, levar o cd para que eles ouvissem a música durante a viagem, tantas vezes quantas as crianças gostam de repetir, ao terem prazer com alguma coisa.
E aproveitava a execução para chamar-lhes a atenção para a guitarra, magistralmente tocada por Robertinho do Recife. É que nunca sabemos o que rola em cabecinhas tão novas. Já fomos assim também, mas esse tempo ficou em nossa desmemória.
E seguimos nós, através da ponte Rio-Niterói, da Linha Amarela, a ouvir e a cantar, por quilômetros e quilômetros, Revelação*.
E isto foi uma saborosa revelação na pequenina grande vida de Gabi e Bruno.
(*Se quiser ver/ouvir a gravação orginal de Fagner, clique no link a seguir: http://youtu.be/KaBS_RYfRCU)
(*Se quiser ver/ouvir a gravação orginal de Fagner, clique no link a seguir: http://youtu.be/KaBS_RYfRCU)
Bruno e Gabi, na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, em 12/6/2011. |
Quem não tem orgulho de dizer "isto ouvi do meu avô"? Dá-nos a sensação de que pertencemos a um tempo bem maior do que podemos ter.
ResponderExcluirLinda crônica, assim como seus netos, que tenho o prazer de conhecer, e a música. Mas você cantando, Mestre, só amor de neto para aguentar. Abraço!
ResponderExcluirZatonio, você é muito maledicente. Deveria ser cortês como o Paulo Laurindo. Eu sou, praticamente, cover do Fagner em seus melhores dias.
ResponderExcluirKkkkkkkkkkkkk.....
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