7 de julho de 2011

POETA, PESSOA FINGIDA*

O poeta é um fingidor
E finge tão descaradamente
Que finge que está fingindo
Só para enganar a gente

E finge que sente dor
Como se uma dor latente 
Almada Negreiros, Retrato de Fernando
Pessoa, 1954, Centro de Arte Moderna,
Lisboa..
Pulsasse dentro do corpo
Quando só no verso se sente
E a gente continua a crer
Naquilo que se pressente
Como se de fato doesse
Lá dentro onde ausente
Não há a mínima dor
De um poeta que mente
E continua fingindo
Só para enganar a gente

*A partir de Autopsicografia, de Fernando Pessoa.

2 comentários:

  1. Olha, vou ter que ler este poemas mais vezes. Passaram-me muitos pensamentos e nenhum encontrou palavras que expressasse o que de fato senti. Num primeiro momento, recusei-me a aceitar a conclusão. Depois ocorreu-me que, assim como as palavras não são, em geral, adequadas para falar dos sentimentos, não poderia aceitar minha primeira impressão; e por fim, compreendi que não se trata de enganar, mas de tentar dar realidade a algo intangível e aqui não se trata de mentir, o máximo que se pode dizer é que o poeta foi impreciso, ao não encontrar as palavras certas (se é que elas existem!).

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  2. É a velha história entre o real e o dizer e as implicações que isto tem. É mais ou menos por aí, como você bem observou.

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