30 de novembro de 2011

TIPOS INESQUECÍVEIS DE QUE TENHO APENAS VAGA LEMBRANÇA

Quió: Vendia jiló na feira e ajudava Toim Cu de Burro a desonrar muares nos pastos, nas noites de lua cheia. Pior que não guardava segredos.
Querêncio: Vivia querendo coisa com Cremilda, filha de Quelemente e Cacilda. Levou pelas platibandas coice de mula prenha e perdeu os dentes da frente.
Zeferino de Zefa: Zelador da Praça do Sabiá. Também tinha zelo por Zoraide, mulher de Zoroastro, que armou zoeira, quando o encontrou cuidando da área de lazer lá dela.
Quintiliano do Cartório: Só trabalhava cantando. Lavrava certidão de nascimento ao som de Mamãe eu quero; certidão de óbito, a poder do hino Com minha mãe estarei; e certidão de casamento, com A moda da mula preta. Averbação de desquite era especial: Acorda, patativa!, de Vicente Celestino.
Cocote: Era o goleiro do Liberdade Esporte Clube e pegava chutes de todos os calibres. Mas não lia, nem escrevia. Ao Jorge, de batismo, o presidente do clube acrescentou Sá, para facilitar que aprendesse a assinar o nome na súmula dos jogos, e assim o registrou.
João Preca: Pegou caxumba e, para não ficar rendido, ficou um tempão de cama. Aproveitou para aprender a tocar violão e nunca mais cavucou um buraco, carpiu uma roça, arrancou um toco. E tocava sempre: “Peida aqui, caga no canto, que eu daqui não me levanto”.
Bonga: Ponta esquerda do Liberdade Esporte Clube. Nos dias úteis, carreava bois, os quais espicaçava com grande remorso. Nos inúteis, dava botinadas impiedosas nos zagueiros adversários, pelo Campeonato Bonjesuense de Futebol. Tinha a pele exageradamente tinta de melanina, de modo que, de branco, só o branco dos olhos e dos dentes.
Zé Caboclo, Dentista
(artepopulardobrasil.
blogspot.com).
Alcides Dentista: Subia em lombo de mula os caminhos da serra, arrancando dentes, devastando bocas – o paciente sentado nas toras amontoadas no terreirão. Quando voltava, tirava do saco de aniagem as dentaduras que ia experimentando nas bocas murchas, até encaixar firme. Cobrava barato e tinha muito serviço.
Barrosinho: Dono de botequim, misturador de refresco e fazedor de picolé. Deixava as formas lavadas do lado de fora no quintal, de modo que seus picolés sempre tinham uma penugenzinha de pombo, a destacar os sabores: de coco, de creme, de groselha e de uva.
Carlinda do Procópio: Tinha ficado viúva do Procópio, mas não perdeu o nome. Criava galinha e pato e, na altura dos quarenta e tantos anos, começou a dar bola para Chico Padeiro, que enfiou a mão na massa de não deixar partes sem apertar. Carlinda ficou um brinco de pessoa, toda jeitosa.
Chico Padeiro: Já peguei Chico Padeiro na virada dos sessenta anos, por sua vez já viúvo de Carlinda, a qual não aguentou tanto aperto, tanto amasso. Chico Padeiro era bom de um tudo, mas pensava que as carnes de Carlinda fossem massa de rosca baroa.
Tatão Florindo: Homem forte, dobrado, pegador de vaca pelo chifre. Trabalhava na Fazenda do Jacó e, nas festas de São João, passava sobre as brasas da fogueira com os pés descalços. A sola dos pés era grossa de quase um dedo. Queimava a bainha da calça, porém os pés saíam fumegando, mas sãos.
Zé Gago: Zé Gago era mestre em gaguejar. Gaguejava até nas vias-sacras na época da Quaresma, rezadas na Capela de Santo Antônio. Quando ele não aparecia na reza, dava uma diferença tão grande, que o sacrifício ficava bem maior. Meu joelho doía ainda mais.
Dona Cotinha Rezadeira: Tirava tudo que é tipo de malefício do corpo: pescoço duro, lumbago, descadeiramento, dor de olhos, espinhela caída, esporão, caxumba, unha encravada, panarício, bucho virado, tersol, nó nas tripas, lombriga, verrugas e até infestação de piolho em cabelo de menino de escola. Não cobrava nada, mas aceitava doações. Sempre estava com um pano branco sobre os cabelos.
Pedro Puri: Maluquete que se dizia índio puri, nascido e criado em “Capiun”, como ele chamava Itaperuna em seu jeito estropiado de falar (Itaperuna já não via índio há mais de cem anos). Vivia de ganhar dinheirinho miúdo comendo baratas em frente a mulheres, que saíam correndo esbaforidas de nojo. Depois de mastigar a barata, ia cobrar o combinado, com o engraçadinho que encomendara a troça.
Homem da carroça, de Luís Rodrigues
(em naturezamoldável.blogspot.com)
Seu Osório: Revisteiro, que é como chamávamos aquele jornaleiro itinerante da vizinha Boa Vista, que, uma vez por semana, ia à vila. Sua carroça era toda montada para transportar galinhas, patos, galinholas, que ele comprava durante as viagens para revender em outros lugares, como comerciante de aves e ovos. Minha mãe tinha coleção gigante de O Cruzeiro, comprada dele.

Um comentário:

  1. Estas nossas figuras são fantásticas, lá em Calçado, dentre outras, tinha o Alceu Tira-Prosa, sobrinho de outra, o professor Aderbal, que foi seu professor.

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