24 de novembro de 2011

COMPRA E VENDA DE APARTAMENTO COM SUÍTE E HIDROMASSAGEM

Imagem em barradatijuca.com.br.
Depois de procurar criteriosamente, fez um círculo vermelho em torno do pequeno anúncio de venda de um apto., excelente local., andar alto, recém-reform., salão em L, 2qtos./1ste. c/hidro, banheiro soc., coz., var., dpc, garag., docs. em ordem. Viu que o preço lhe servia, telefonou, para marcar visita. Atendeu voz de mulher que, por seus cálculos, andava pela casa dos trinta e tantos.
Na hora marcada, chegou com precisão, anunciou-se ao porteiro e subiu, após o consentimento da moradora.
Por cavalheirismo, embora mais velho cerca de dez anos – ou pouco mais – que a vendedora, chamou-a dona Priscila. Ela, simpática, estendeu-lhe a mão, enquanto, atrás de si, apareciam suas duas filhas. A pequena, toda espevitada, olhou-o com olhos sapecas de seus cinco anos. A mais velha, mais séria, entrando na adolescência, poderia ter aí onze/doze anos.
Depois do cumprimento geral às crianças, entrou na ampla sala, onde a menorzinha, Isabel, como se apresentara à porta, começava seus exercícios de dar estrelas na diagonal da sala com poucos móveis.
À medida que acompanhava Priscila pelos cômodos da casa, que examinava com certo cuidado, seguia como perdigueiro o suave perfume de sabonete vindo da dona do imóvel, a denunciar banho recém-tomado, e tendia a certa distração.
Entrou na cozinha, também ampla, e reparou os azulejos até o teto, a meia parede que a dividia da área de serviço, o quarto da empregada no fim, o banheiro ao lado. Não prestou muita atenção, já um pouco mais disperso, inebriado, quando ela lhe disse que, recentemente, o condomínio trocara os tubos de esgoto e água do condomínio, porque os antigos haviam enferrujado – de ferro eles eram.
Deixou que a mulher o guiasse à suíte, até para continuar a sorver no ar o perfume que vinha dela, e não notou muito no que ela dizia sobre a pintura recente de todo o apartamento, em função das obras que o condomínio fizera nas instalações hidráulicas.
Ela acendeu a luz do banheiro da suíte, que ele examinou mais detalhadamente, como a querer imaginar Priscila ali tomando banho, deixando a água escorrer por seu corpo, sua pele branca, seus cabelos escuros. Demorou mais neste pequeno cômodo, com a desculpa de abrir torneiras e dar a descarga, para avaliar a pressão da água. E imaginou-a enxugando-se sobre o tapete em que percebeu a umidade de fim de banho. E continuou a pensar bobagens com a mãe das meninas.
Vistoriou o quarto das pequenas, que agora estavam na sala brincando de bater as mãos ao compasso de uma música infantil. Olhou a decoração singela e perguntou se aquele armário do quarto permaneceria ali ou seria removido. Porém não prestou atenção à resposta, porque sentiu a respiração dela atrás de si, o frescor do banho, o aroma de seu hálito de dentes escovados há pouco.
Resolveu fazer a pergunta crucial, em vista das caraminholas que rolavam em sua cabeça, ao ver aquela jovem mulher, suas duas filhas crianças e a ausência do marido, que, quem sabe, ainda não chegara do trabalho, o trânsito tão tumultuado atualmente:
- Dona Priscila, a senhora e seu marido, por acaso, aceitam uma contraproposta ao preço anunciado?
Ela sorriu um tanto sem graça e disse que ela – e frisou bem o pronome de primeira pessoa – aceitaria, porque seu marido já tinha abandonado a casa e as meninas, atrás de uma doidivanas qualquer que trabalhava com ele.
- Pois então, dona Priscila, peço que aguarde telefonema meu amanhã, pela manhã. Vou fazer umas contas e ligo cedo para a senhora. Gostei muito do imóvel, da conservação, da localização. E, se me permite, simpatizei com a senhora e as meninas.
Confirmou o fixo e o celular, apertou-lhe a mão, agora com mais firmeza, e sentiu nela leve tremor, como quem tem pequeno calafrio. Fez um carinho na cabeça das meninas, perguntou o nome e a idade da mais velha – Sabrina, onze anos – e saiu com a cabeça nas nuvens, quase pisando flocos de algodão doce.
Ela se demorou um pouco, antes de fechar a porta, e olhou-o apertar o botão do elevador, como que a confirmar que ele iria embora.
Naquela noite, Carlos Eduardo – este é seu nome – não conseguiu dormir direito. Seus cinquenta anos de biscates foram sensivelmente abalados pela presença de Priscila, sua pele clara, seus cabelos negros, o sorriso um tanto sem graça, as duas meninas de olhar esperto e cabelos encaracolados, ligeiramente claros.
Dia seguinte. Telefonou pelas nove horas para fazer a contraproposta. Abateu apenas seis por cento no valor pedido pela proprietária que, com a voz demonstrando discreta felicidade, disse-lhe que pensaria e à tardinha, no mais tardar, daria a resposta. Ele lhe pediu preferência, caso não houvesse prioridade anterior, e pôs-se ao aguardo de sua resposta. Desligou o celular, cerrou o punho, como quem comemora alguma coisa e olhou para o teto do escritório, prenunciando algo.
À tarde ela ligou para ele, aceitou a oferta e seu convite para que almoçassem no dia seguinte, para estabelecer os acertos finais e fazer mais algumas perguntas.
Ao final do almoço, acertou o preço da venda, a forma de pagamento e o pedido formal para que ela não saísse de casa com as meninas. Apaixonara-se por ela e não queria perder a oportunidade de um bom negócio para mobiliar seu coração vazio.
Ela pediu um prazo para se desocupar do ex-marido, enquanto corressem os documentos de compra e venda e pudesse livrar seu coração das tralhas que acumulara durante uma relação dolorida. Tão logo estivesse tudo em ordem, o novo proprietário poderia se apossar dos novos bens que lhe pertenceriam.

2 comentários:

  1. Eu não sei, mas comprar apartamento já mobiliado com mulher e filhas alheias, só mesmo com muita paixão.

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