Ney Matogrosso está cantando lá na Praia de Icaraí. Ouço daqui do meu apartamento seus trinados em falsete. Voltou a chover. Gosto do Ney, mas já gostei mais. Porém o que me preocupa, verdadeiramente, neste instante, é a contribuição que posso dar ao meu estimado leitor, com algumas breves considerações acerca da banana.
Sempre esteve entre as minhas preocupações intelectuais que deveria falar desta fruta especial. Aproveito, então, para fazê-lo agora.
Banana é essa fruta cantada em prosa, verso e marchinha de carnaval, com a sem cerimônia de quem é muito íntimo. Talvez a fruta que deu mais intimidade ao brasileiro seja a banana. Não se pode entender a nossa civilização (?) tropical e tupiniquim sem a banana. Mais do que o café, o futebol e o carnaval, a banana foi a grande propulsora da nossa interiorização. Chegamos, inclusive, na ânsia de conquistar mais e mais território, no período das entradas e bandeiras, a disputar com bandos de macacos, no meio de florestas, um cacho de bananas madurinhas, pintadinhas. Não é preciso dizer quem venceu a disputa, não é mesmo?
Muitos outros povos têm na banana seu alimento básico. Até porque ela era o alimento mais barato, vendido a preço de banana.
E por que a banana tem essa importância crucial para nós? Ora, simplesmente porque é a fruta mais bem projetada que a natureza conseguiu fazer. Nenhuma outra oferece a facilidade e a segurança da banana para o consumo.
Em primeiro lugar, a banana, como, aliás, a maioria das frutas, já vem com invólucro. Só que este é facilmente removível, sem auxílio de nenhum tipo de ferramenta. Bastam dois dedos, para que a descasquemos e, a seguir, a devoremos.
Podem vocês argumentar que também se pode comer a pera, a maçã, ou o morango, até mesmo sem a remoção da casca. No entanto, será necessário higienizá-los antes. E aí está o segundo ponto importante. Quanto à banana, basta descascá-la! Dirão, talvez, vocês, na ânsia de me contestar, que também a casca da manga é facilmente removível, com o auxílio dos dentes. Mas e a sujeira que ela faz nas mãos, na boca, nas bochechas? E os respingos que caem na camisa e no sapato? Ah, você está nu, ao lado do valão onde toma banho? Então cairá na sua barriga, se você estiver um pouco fora da silhueta ideal, ou naquele lugar, se for homem bem dotado; ou, se de dotação tímida, o pingo irá diretamente atingir seu dedão do pé. Não há comparação com a banana, que é uma fruta de consumo limpo, higiênico! Nem vem!
Outras vantagens: a banana não tem fiapos, não exige uso de fio dental; não tem caroços para quebrar nosso dente ou provocar engasgos; não tem espinhos que agarrem ao céu da boca; não deixa outro resíduo além da casca, que tem também sua utilidade. Com ela, podemos armar um baita tombo para aquele vizinho nojento ou aquele chefe pentelho, durante o horário de expediente. Ou mesmo fazer uma pegadinha descompromissada na rua com qualquer incauto que vá passando. A banana sempre dá jogo.
Imagem em gourmetvirtual.com.br. |
Até mesmo o design da banana é moderno e anatômico. Imaginem um cavalheiro que coloque uma banana no bolso. Pode passar por alguém que não é. Caso uma mulher a coloque na bolsa, pode fingir que está armada. Esse aspecto anatômico gerou até piada, já velha do tempo do rei. Sua majestade ficava indignado pela sujeira que os camponeses deixavam, a cada final de feira, na praça do castelo. Resolveu, assim, baixar uma determinação proibindo a feira, sob pena de enfiar pelo traseiro do recalcitrante o produto que teimasse em trazer para venda. Devia ser um rei francês cheio de frescuras. Por isso é que, no fim de semana seguinte, sem saber da nova determinação, François vem trazendo uma carga de bananas. Os guardas, postados no portão de entrada, confiscam a carga, repetem em alto som a ordem real e começam a introduzir as bananas em François, que, inopinadamente, começa a rir. Os guardas, estupefatos, perguntam o motivo do riso, já que a pena era dolorosa. “É que meu vizinho Charles vem aí trazendo uma carga de abacaxi!”, disse-lhes ele aliviado, por serem apenas bananas.
E a quantidade de tipos de banana? Aí nem se fala! E os valores nutricionais? Xiiii! É muito alto!
E, sobre isso tudo, ela sustenta, alimenta, mata a fome. E disso tenho experiência própria. Quando menino, ia com meus primos para a casa do tio Aldani, que morava no alto da Serra da Boa Esperança, lá em Carabuçu. Ele já tinha seus quatro filhos. Chegavam mais quatro ou cinco sobrinhos. A situação financeira não era tranquila. O que ele fazia antes do almoço? Simplesmente perguntava quem queria banana. Como não havia um que disse não, levava-nos para o sótão da casa, onde cachos e cachos de banana estavam armazenados, e comíamos algumas. Depois, então, subíamos para almoçar, já com parte de nossos vorazes estômagos de meninos preenchida com a deliciosa fruta. Esta esperteza, meu próprio tio, infelizmente já falecido, confessou em sua festa de bodas de ouro.
Quando a União Europeia se constituía, as autoridades de lá resolveram estabelecer regras sanitárias rígidas para a importação de alimentos, sobretudo os oriundos da nossa combalida América Central e do Sul, da Ásia e da África, isto é, da periferia. Pois muito bem! As regras, se postas em vigor, tirariam boa parte do suprimento de bananas que chega lá, sobretudo, da América Central. Então os alemães, talvez os maiores comedores de banana do planeta, se insurgiram – não o povo, que a questão não chegou até ele, mas as próprias autoridades que discutiam tais medidas – e, quanto à banana, ficou tudo como dantes. Os alemães não podem passar sem sua bananinha diária.
Tenho ou não tenho razão de fazer estas considerações elogiosas a fruta tão especial?
Já me alonguei demais – além do tamanho de uma banana – e paro por aqui. Vou até a cozinha comer uma deliciosa banana maçã madurinha, que, ainda há pouco, ficou olhando para mim de forma muito oferecida.
E aí lembrei que o Ney Matogrosso devia estar entoando nada mais nada menos que Chiquita Bacana.
ResponderExcluirEu, como "bananófilo" inveterado, apoio o belo apanágio sobre as deliciosas frutas.
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