28 de setembro de 2011

CÉU DE ESTRELAS


Edvard Munch, Noite estrelada, 1922.

O velho carro, adaptado para rodar a gás de cozinha, pachorrentamente varava a noite no asfalto, com a pressa dos moribundos. Seu dono, piloto e mecânico, Geneci, ia socorrer outro carro enguiçado dali a treze quilômetros e vadiava a viagem com algumas histórias engraçadas, quase inverossímeis, sempre arrematadas por frases como “não quero ter pernas pra chegar em casa”, “por essa luz que me ilumina”.
E eu olhava meio incrédulo aqueles dois projetos de fachos de luz lançados dos faróis cansados, mas ria gostoso das histórias do mecânico, que me garantia pôr andando um carro em que outro gastou quatro horas para chegar à conclusão de que ele não andava por qualquer razão inexplicável.
De fato o carro andou depois de vinte minutos do toque mágico de Geneci, mecânico já mais que engraxado em eixos e bielas. Andou sob protesto até o fim da viagem, como se não quisesse chegar.
A noite, entretanto, estava tão estrelada, de quase nunca se ver, que talvez fosse melhor o carro ter empacado até o dia raiar, para que eu não perdesse um espetáculo que já há muito meus olhos simples deixaram de contemplar na cidade grande.

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