(Para a amiga Cleia Miranda, protagonista da história.)
Já cansada de mal respirar em sua vida, minha amiga Cleia procurou socorro numa médica indicada por vizinha que teve o filho curado de uma asma renitente, que se apossara de seus pulmões, tão logo metera a cara no mundo. Segundo sua versão, mal o menino botou a cabeça para fora, já reclamou falta de ar.
A vizinha gavou muito a competência da médica, com consultório montado lá para as bandas de Areia Branca, em terras do município de Nova Iguaçu.
Com o endereço anotado num pedacinho de papel, minha amiga partiu para o local, que, em hipótese alguma, fazia jus àquilo que se poderia chamar de clínica ou consultório. O imóvel era singelo demais para desbaratar asmas e bronquites, como a propaganda dizia. Mas, já que tinha andado tanto, resolveu entrar.
Faço aqui um parêntese, para que não julguem minha amiga ingênua. Não sei se sabem meus possíveis leitores, mas os asmáticos e os brônquicos, pela própria natureza de suas mazelas, são levados a acreditar em todo tipo de tratamento, por mais estranhos que sejam, pois têm a esperança imorredoura de que, um dia, seus pulmões funcionarão a toda carga.
A casa era simples, e da sala de recepção, onde já estavam algumas pessoas tentando capturar qualquer arzinho que pudessem, através de seus narizes praticamente inoperantes, ela observou uma cozinha bem acanhada, em que se instalavam um fogãozinho Jacaré de duas trempes, alguns utensílios de alumínio um tanto gastos pelo uso, uma pia de qualidade duvidosa e aspecto ainda mais duvidoso, vidros e apetrechos mais.
Ao sair o cliente que estava sendo atendido, ela teve o seu nome cantado pela figura de jaleco branco, em cujo bolso estava bordado Dra. Osvaldina, numa caligrafia errática. Desconfiada, minha amiga tentou vislumbrar o diploma que, costumeiramente, se coloca logo atrás da cadeira da doutora, o que não foi possível por inexistente.
A figura da esculápia – permitam-me o neologismo - era uma mistura de cozinheira de barraca de feira e vendedora de cocada baiana da Praça Quinze – sem demérito nenhum para essas profissionais. Eu mesmo já tive um excelente professor de Fonética e Fonologia que, com seu jaleco branco, dava aparência de dono de açougue. Em suas aulas, ficávamos aguardando quando ele tiraria de sua pasta uma chaira e uma faca de desossar. O que nunca aconteceu, é bom que se diga.
Pois então! Diante da situação que se apresentava, Cleia tentou saber da pressuposta doutora a eficiência de sua medicina, ao que ela afirmou que a cura se daria em pouco tempo, não necessitando de alongar tratamento, já que tinha desenvolvido um remédio definitivo, a ser administrado por injeção subcutânea, que era porreta para qualquer tipo de malefício advindo das partes respiratórias e adjacências. E o tratamento poderia começar naquele mesmo instante, era só a paciente oferecer o local onde ocorreria a agulhada. Com mais cinco ou seis, o mal estaria debelado para sempre, de nunca mais ser lembrando, nem mesmo por ocasião do espargimento de pólen pelas mimosas flores da natureza. Coisa garantida!
Cleia assustou-se com a segurança da médica e, para se garantir da ciência de que era portadora, fez a pergunta básica:
- Doutora, qual é a diferença entre asma e bronquite.
Imagem colhida em riodejaneiro.muraldacidade.com. |
Pelo início da resposta, minha amiga decidiu não se submeter a tal temeridade.
- O pobrema básico tá no diafragno, que não funciona nos conformes da anatomia humana.
E a afamada doutora Osvaldina perdeu, de imediato, uma paciente com mais de cem por cento de indicação para seu miraculoso medicamento, projetado, desenvolvido e alambicado na cozinha que ficava ao lado de seu consultório.
Para se safar, Cleia alegou ter bebido duas cervejinhas, enquanto aguardava a hora de sua consulta, e julgava que o tratamento deveria começar depois. Doutora Osvaldina ainda deu como certo que o álcool, inclusive, ajudaria na ação do remédio, mas minha amiga resolveu marcar para outro dia, outra hora, que, mais de vinte anos passados, ainda não aportaram no calendário. É o tal dia de São Nunca de tarde.
Trinta ou quarenta dias depois, Cleia vê estampada no jornal foto da sergipana presa por exercício ilegal da profissão.
E, por ter sido viva na ocasião, continua viva até hoje, a poder de bombinhas e nebulizações.
Pai Zatonio cura qualquer asma , bronquite, viadagem, brochura e assemelhados. Tudo com 101% de garantia.
ResponderExcluirCaramba! Você se lembra ainda! Tô besta! Daquela vez, graças a Deus não fui!
ResponderExcluirEscrevi o causo à época, por isso é que está tão próximo aos acontecimentos.
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