A mulher,
com cara de acompanhar enterro de parente querido, fingia limpar as unhas com
alicatinho de manicura, a tevê ligada num programa qualquer de leilão de bois. Bóbis
no cabelo e a má vontade de anos de um casamento chocho.
Ele falou um
oi de lado, em direção à parede da televisão, para que ela não percebesse o
bafo. Inutilidade pura. O azedume empesteou a sala pequena, com a brisa que
entrava pela janela jogando contra ele, servindo de testemunha de acusação.
Ela não
respondeu ao cumprimento, mas falou que o prato estava arrumado dentro do micro-ondas
e que iria deitar-se.
O marido foi
tomar um banho caprichado antes de engolir a gororoba. E ainda lambeu, como
aperitivo, um cálice de conhaque de gengibre.
Quarenta minutos
depois, deitou-se ao lado da mulher, que já ressonava de cansada. Ele pôde,
então, observar-lhe as olheiras dolorosas e tensas. Pensou de si para consigo:
mulher assim é um perigo; pior ainda se estiver nos dias das regras. Aí é um
perigo só! É surucucu no choco!
Porém não chegou
a arrepender-se da esbórnia, e ainda remancheou na cama por alguns minutos,
tentando encontrar uma boa desculpa para o café da manhã, quando,
necessariamente, haveria a discussão da relação, que já andava pela bola sete.
Por volta
das três da manhã, ao se virar no leito, levou a mão para o lado da mulher,
imaginando possibilidades perdidas na madrugada. O gesto foi inútil: ela não
estava ali.
Olhou,
então, no relógio de cabeceira e viu nos números iluminados: três horas.
Sobressaltou-se.
Pulou da cama e não viu luz no banheiro. Caminhou pela meia escuridão da casa e
a encontrou na cozinha, fogo ligado, caçarola com água quase à borda, prestes a
ferver, as primeiras bolhas soltando do fundo.
- Que está
fazendo, mulher?
Com cara de
pastel, ela lhe diz que estava fervendo água para o café.
- Mas às
três da madrugada, mulher?! – Espantou-se.
- Me deu
vontade! – disse-lhe com a mesma pachorra de antes.
Acendeu-lhe
o pisca-alerta. E, num átimo, diz para ela:
- Então vou
à padaria comprar pão fresquinho.
Foi e não voltou
até hoje!Imagem em noisentranse.blogspot.com. |
Acredito que a mulher nem foi á polícia!... Com sorte pode ser que ele continue sem aparecer!...
ResponderExcluirBesta é que ele não era...hahahahaha...lá em Calçado uma matou o desavergonhado do marido enchendo os ouvidos de d'água fervente.
ResponderExcluirRapaz, quando a mulher entra na fase do silêncio, sai de perto que lá vem Medéia!
ResponderExcluir