Dei o título desta crônica em inglês, chupada do livro How to be a carioca, da norte-americana Priscilla Ann Goslin, a fim de que vocês possam aquilatar as dificuldades que tive em fazer do meu filho, nascido em 1977, um sincero torcedor do Glorioso, ainda que passe por crises frequentes, quando nosso time faz suas trapalhadas.
Seu nascimento ocorreu, como se percebe, na fase negra do clube, período que compreendeu um jejum de títulos cariocas por 21 anos, e só encerrada no glorioso 21 de junho de 1989, aos 21 minutos do 2º tempo com o catártico gol de Maurício, contra o Flamengo. Deixei os números grafados em algarismos para a coisa ficar um tanto cabalística, como é de nossa folclórica estima.
Naquela noite em que nos sagramos campeões invictos, ele já com doze anos foi para a varanda do apartamento gritar alucinadamente em comemoração. Vários vizinhos também chegaram a suas varandas para lhe dar os parabéns, pois sabiam de sua paixão desenfreada pelo alvinegro e o sofrimento por que passávamos.
Mas, até que chegasse a isto, foi um percurso cheio de peripécias. E parte delas já narrei em outra crônica (Tua estrela solitária nos conduz).
Depois de providências normais - camisa do time, conselhos do pai, etc. -, levei-o ao Maracanã com frescos dois anos de idade. Meu amigo Chico Pereira, irmão do grande ator Tonico Pereira, foi comigo e garantiu a segurança do pequeno. Foi o próprio Chico que me incentivou a isso: “Leva o Pedro, que ajudo a tomar conta!”, já visando a aumentar nossa torcida.
Mas nem havia necessidade.
Não me lembro bem por que, mas o Maracanã estava meio às moscas, embora o jogo fosse contra o Vasco. E ficamos tranquilamente sentados do lado da sombra, com muito espaço à nossa volta. Talvez reflexo daquela fase medonha que vivíamos.
O primeiro tempo terminou em 1x1, e Pedro se manteve acordado. No início do segundo, ele quis dormir, e o estendemos sobre nossas pernas. Ainda tentei incentivá-lo, dizendo que logo, logo faríamos um gol. Mas antes mesmo de pegar no sono, o Botafogo fez o segundo gol e manteve o resultado até a final. E ele também se manteve acordado até o fim.
Voltamos, a partir de então, várias vezes ao Maracanã e, posteriormente, ao Caio Martins, onde, durante bom tempo, mandávamos nossos jogos.
E, com as idas e vindas do time, foi-se construindo nele o amor pelo time que, às vezes, se transformava em ódio, diante de derrotas quase inexplicáveis.
Já na final do Campeonato Brasileiro de 1995, no jogo em São Paulo contra o Santos, ele ficou de tal forma nervoso, que se retirou para a cozinha, para não sofrer com o término da partida.
E só foi à varanda gritar desesperadamente, após eu lhe garantir que tínhamos conquistado o título e ele ter tomado uma dose reforçada de Maracujina, que sua mãe preocupada lhe dera.
Ele sempre ia comigo, fazendo uma torcida decidida, apaixonada e, comumente, meio ensandecida. Como no jogo contra o Palmeiras pelo campeonato brasileiro de não sei quando.
Estávamos nas arquibancadas descobertas do Caio Martins. Estavam conosco os amigos Zé Antonio Lahud e Pedrinho Mello – que não é meu parente como possa parecer – com seus filhos ainda crianças, mais um amiguinho deles. Estes se sentavam no degrau inferior. Nós, no superior.
Veio até o canto esquerdo do ataque do Palmeiras, a fim de cobrar um escanteio, o meio-campista Darci, um jogador aloirado, tipo sulista.
Pedro, já rapazola, voz poderosa ressoando num peitoral de responsabilidade, troa em direção ao palmeirense:
- Darci, seu merda! Seu pai é corno, sua mãe tá na zona, sua irmã é puta!
Os meninos do degrau debaixo viraram a cabeça, espantados com a sequência de xingamentos. Eu, inclusive, chamei sua atenção, pois notei que os garotos ficaram chocados.
Darci chutou o escanteio para fora, longe de nossa meta.
Naquele domingo, ganhamos o jogo.
Acho que o Pedro teve uma participação decisiva no placar.
Hoje está um tanto mais equilibrado, se é que se possa dizer que um torcedor de futebol seja equilibrado, mas mantém alguns rompantes de euforia e ódio, conforme as trapaças que o time da Estrela Solitária nos arme.
Mas como poderia ser diferente?
Não há outro caminho: ou é este, ou este!
Imagem em letrasrelicario.blogspot.com. |
Ai...ai...só uma correção histórica: gol do Maurício foi aos 21 minutos e não aos doze. O que não muda o resultado de nossa gloriosa vitória.
ResponderExcluirNa primeira versão, tinha posto 21, mas fui conferir no "genérico de Deus", como você diz, e achei lá 12. Por isso inverti. Mas já vou recorrigir.
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