Põe
vinte aí no galo. Cerca pelos sete lados, que esse bicho é arisco. Quero ver se
ganho alguma coisa. Estou a neném e com algumas contas atrasadas. Pelo menos, a
conta de luz eu pago. Se ficar sem luz lá em casa, Dona Encrenca encrenca de
vez! Se ficar sem ver a novela, posso me considerar um homem morto. Defunto
encomendado e garantido. Põe mais dez na cobra. É que eu tenho uma dentro de
casa. A sogra mora comigo há uns dez anos, desde que seu Gervásio morreu. Homem
bom tava ali! Era como um pai. Que Deus o tenha! Agora, ela... é uma canina! Só
não me inferniza mais com a filha, porque já estou mais sujo que pau de
galinheiro, que chão de curral. Sabe chão de curral? Pois é, cheio de bosta de
vaca! Eu sou do interior e via isso lá. No milhar, põe cincão. Cercado e
invertido. Vem aí o dia das crianças, e o menino pediu um presente. Se não der,
é outra confusão na minha vida. Aí serão a mulher, a sogra, que já é de praxe,
e o filho. Já pensou?! Meu menino até trocou de time, porque pegou birra
comigo. Torcia pelo meu time. Só porque falhei com ele no aniversário, num ano
desses aí, ele embirrou e disse que agora torce pelo Botafogo. É mole? Você,
cruz-maltino, ter um filho botafoguense! Fiz tudo por aquele moleque, e ele me
fez essa desfeita! Também vivo lembrando a ele o gol que o Dinamite fez em cima
do Osmar. Lembra? Mas ele diz que não liga. Ele não era nascido. Aí fica me
jogando na cara o campeonato de 97 em cima da gente, quando já era nascido –
tinha só dois anos –, mas fez questão de se informar na internet só para me
fazer raiva. Fica lembrando o gol do Dimba e a rebolada no final do jogo. Só
vale a partir do seu nascimento, diz ele. Vou te contar: é só problema na vida!
Trabalho no almoxarifado da empresa como uma besta, e é só pepino. O salário,
às vezes, atrasa e as contas vão pras cucuias. Veja só: estou com o pendura do
botequim também atrasado. Seu Manuel ainda vai ter de aguentar mais uns dias.
Pior que eu fico sem poder passar até na calçada do bar. Não quero ser
envergonhado com ele me cobrando na frente dos outros. Aí, quando receber, vou
lá e pago, e invento uma desculpa: estava doente, coisa assim. Nem de beber, a
gente tem direito. Vida de pobre é foda, cara! Por isso é que eu, às vezes,
faço a minha fezinha no bicho. Quem sabe? Um dia eu ganho, acerto no milhar e
ponho tudo nos eixos. Do jeito que está, é que não posso ficar. Põe mais dois,
no grupo. Não é nada, mas pelo menos salvo o que apostei e aí as coisas vão ser
adiadas por mais uns dias. Também quem me mandou nascer pobre. Pobre é foda,
cara! Tem mais é que levar ferro! Não tem aquele ditado que diz que pobre e
cachimbo nasceram pra levar fumo? Pois é! É isso mesmo! Minha mulher fica me
mandando entrar pra igreja dela, pra eu dar um rumo na vida, que eu tou muito
perdido... essas coisas. Como é que vou? Eu tou é durango, mesmo, cara! E o
pastor ainda vai me cobrar dez por cento. Com esse dinheiro, eu jogo no bicho.
Deus, se tiver compaixão de mim, há de ver a minha luta e me socorrer. O
pastor, quando abriu a igreja, nem carro tinha. Andava de ônibus. Hoje, desfila
com um carrão bonito, cheio de pneu e antena. Ainda teve a coragem de botar um
plástico no vidro de trás: Propriedade do Senhor Jesus. Tem cada cara de pau! É
o Senhor Jesus que paga o IPVA, que vai passar fim de semana no hotel fazenda,
que bate o carro? Isso ela não vê. Mas, se eu falo assim em casa, arranjo mais
confusão pro meu lado. Desculpe, companheiro, ninguém precisa ficar ouvindo
minhas lamentações, mas é que chega uma hora em que, se a gente não desabafa, a
cabeça explode. O bom é que sobrou ainda um dinheirinho, que vou ali no
botequim tomar uma, senão ninguém aguenta.
É dois! Uma prá mim também.
ResponderExcluirTexto delicioso! Se estivesse aí também iria ao botequim tomar uma com você!... Assim, tome duas, uma por mim... Cumprimentos à sogra e cinco reais p'ró prior...
ResponderExcluirSeja bem-vindo, Moreirinhas. Obrigado e proximamente publicarei o poema que sua foto ilustra muito bem.
ResponderExcluirMestre, ao menos o filho se salvou. Uma crônica digna do Sérgio Porto. Parabéns!
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