12 de setembro de 2012

TRAIÇÕES CABOCLAS II

Consta dos anais extraoficiais da família, não escritos e calados durante décadas, que meu avô Juquinha de Paula gostava de uma aventura extraconjugal, o que, para mim, é algo extraordinário, pela imagem que tinha dele: um homem simples, um tanto vergado pelo tempo, sempre de chapéu à cabeça, bigode tradicional enchendo o espaço entre o nariz e o lábio superior, a boca com carência de vários dentes. Quer dizer, a anti-imagem de um fauno. Porém, como qualquer avô, ele também passou por todas as idades, por todas as fases de um homem, e pode ter tido lá seus encantos, seus poderes sobre as mulheres. Como, aliás, todos os nossos antepassados, daqui e d'além-mares, ou não seríamos aos bilhões de hoje.
Uma dessas mulheres, a Fizinha, era justamente a empregada da casa, com quem manteve uma relação que acabou chegando ao conhecimento de minha avó. Segundo as bocas de trapo da época, Papai Juquinha, como afetuosamente o chamávamos, teve até uma filha com a empregada.
Apertado em inquérito conjugal pela delegada da família, minha avó, deu a desculpa masculina esfarrapada de sempre: a mulher se oferecera a ele, que acabou por cair na tentação.
Quando a bomba explodiu na casa dele, a empregada tomou a iniciativa unilateral de não aparecer mais no local de trabalho, porque conhecia muito bem os maus bofes da patroa.
Dona Julinda, que também era carinhosamente chamada por Maína por filhos e netos, resolveu não deixar barato o desfrute da pobre infeliz - naquela altura da vida, mulher não se separava do marido apenas por isso. Chamou Benedito, um fiel empregado da família, a quem encomendou "uma coça bem dada naquela desencaminhadora de marido alheio". Por conta deste trabalhinho extra, ela lhe daria uma camisa de linho, de manga comprida, e seguraria as pontas, caso pudesse haver quaisquer consequências indesejáveis.
Minha mãe conta que, ainda criança, viu o Benedito escolhendo cuidadosamente uma gurumbumba dentre algumas e ainda lhe indagou sobre a finalidade do seu uso. Ele, escamoteando a verdade, respondeu que era para se defender de cachorro brabo pelos caminhos a percorrer.
Posteriormente, dando conta da missão, Benedito revelou apenas que a tunda não foi bem aplicada, porque topou com Fizinha na passagem de uma pinguela, sobre o valão Liberdade, e, assim que lhe deu a primeira gurumbumbada, com a etiqueta de "isso é da parte da minha patroa!", a coitada caiu no valão e aproveitou para fugir.
Como reparou minha mãe, dias depois Benedito estava todo elegante com sua nova camisa branca de linho, a contrastar com sua pele negra brilhosa de sol.

Imagem em entretenimento.uol.com.br.


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