26 de outubro de 2011

POR UM BIDÊ

Viúva, fora morar com o filho mais velho, a nora e os netos, após alguns anos de solidão na casa grande da serra de Rosal de Santana, já quase embicando para o Espírito Santo, em terras de São José de Calçado.
Habituada à dura vida da roça, embora de algumas posses, sem contato com os confortos que o século XX oferecia. Principalmente, banheiro montado dentro de casa. Na sua época, essa peça quase não existia. Ou, quando existisse, ficava apartada do corpo da construção e atendia pelo nome de quartinho.
Assim, começou a se deliciar com cada aparelho novo, cada objeto que facilitava a vida: o liquidificador, a panela de pressão, o fogão a gás, o rádio, a televisão e o banheiro ao alcance da mão. Sobretudo, o banheiro. E, no banheiro, a paixão maior: o bidê. Que aparelhozinho interessante, confortável! Era sentar ali e perder quase uma manhã toda, a água quentinha, carinhosa, sensual. Ela que já perdera seu homem há muito, quase deslembrada dessas coisas saborosas. Mas ali estava o bidê aconchegante, amigo, amante.
Imagem em gartic.uol.com.br.
A nora, quando descobriu o motivo de tanta demora no banheiro, ficou entre chocada e penalizada. Comentou com o marido que, cheio de pudores filiais, mandou fazer uma reforma geral. A peça, propositadamente, foi esquecida.
A velha, ao ver o novo banheiro sem bidê, entrou numa depressão tão grande, numa apatia tão dolorosa, que o filho se viu na obrigação de, por amor filial, devolver ao seu devido lugar o aparelho objeto do prazer do restinho da chama que ainda queimava dentro de sua velha mãe.

Um comentário:

  1. Nem vem que não, essa velhas taradas de Bom Jesus não aceitamos lá em Calçado. Rachando de rir...

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