Dia desses, saí para
fotografar o pôr do sol e me dirigi para o promontório onde está o Museu de
Arte Contemporânea de Niterói – MAC. Como o sol ainda estivesse um pouco alto,
senti que seria possível caminhar um pouco mais, até chegar à avenida litorânea
em frente ao novo campus da UFF, no
Gragoatá. Resolvi, então, conferir o visual de sobre a ponte que liga o
continente à Ilha da Boa Viagem, a qual já percorri exatas três vezes de cabo a
rabo. Nesse dia, não cheguei ao fim.
Lá já estavam alguns tipos
humanos. Um homem da minha idade, mais ou menos, que parecia procurar um bom
sinal de celular, que ele dedilhava. Logo a seguir, estava outro homem um tanto
mais jovem, de roupa social – calça, camisa de manga comprida, sapatos pretos –,
debruçado sobre o guarda-corpo, olhando em direção ao MAC, com uma expressão
grave. Imaginei que estivesse pensando em se matar, mas verifiquei que a altura
da ponte não seria suficiente para tal, e também porque, lá embaixo, havia a
areia fofa, que na maré vazante fica à mostra e permite chegar à ilha por
terra. Do lado oposto, estava uma bela jovem morena, com seus fones de ouvido,
a captar imagens do pôr do sol. Porém um pouco antes dela, um homem mais jovem,
gordo, alto, enrolava uma linha num carretel. Distraidamente lhe perguntei se seria
possível pescar dali, ao que me respondeu que estava soltando pipa. Ele me
chamou a atenção para um grupo que fazia fotos à beirinha da água: uma bela
jovem de biquíni fazia poses para três fotógrafos. Parecia coisa de
profissionais. Sugeriu-me, então, que desse um foco sorrateiro na moça, que,
daquela posição, parecia ter um bumbum muito bem feito. Segui adiante, sem o
atender, para fazer minhas fotos. No final da ponte, havia um grupo de amigos
que conversavam.
Ao voltar, percebi que o
homem que me parecia um possível suicida já estava de conversa com uma moça pouco
mais nova do que ele, também vestida socialmente. A cabeça dá suas voltas para
imaginar que os dois, provavelmente amantes, marcaram encontro sobre a
pontezinha da ilha, lugar inusitado, onde ninguém que os conhecesse pudesse
vê-los. Não sei o que falavam, pois não tenho ouvidos para isso. Mas o
contraste entre a visão inicial – homem sério, olhando o nada – e a cena de
agora – homem conversando com mulher que acabara de chegar – me levou a
fantasiar o encontro de amantes, não para o sexo, mas para ajustarem os
ponteiros, como se dizia outrora. Deveria haver algum ruído na relação, que precisava
ser contornado. Ou, quem sabe, ele, descoberta a pulada de cerca pela esposa,
teve de, a contragosto, dar um fim nesse seu caso e pensou que naquele panorama
a dor da moça seria um pouco menor. E também que ela não teria as condições
ideais para se atirar, desesperada, ponte abaixo, porque isso não a levaria a
nenhum lugar além daqui. No máximo, ao hospital.
O pôr do sol talvez seja momento
menos ingrato para esse tipo de conversa. De manhã cedo, seria muito
imprudente, já que a pessoa acorda com o espírito totalmente desarmado e pode
ter uma reação inesperada, de consequências imprevisíveis. Ao meio dia,
atrapalha-se o almoço, ou a digestão dele. À noite, certamente, ele já deveria
estar em casa, comendo com o prato na mão, diante da tevê, acompanhando os
derradeiros capítulos da novela, ao lado da esposa com cara de não-me-toques. Assim,
avisada por ele do encontro irrevogável àquela hora da tarde, seu espírito teve
o expediente interior para se preparara para o pior.
Não testemunhei o desfecho
do caso, mesmo que sem palavras – me habituei a ver alguns filmes mudos e
aprendi a entender cenas sem palavras –, porque o pôr do sol estava cada vez
mais interessante um pouco mais à frente, já diante dos novos prédios da UFF. Mas
imagino que a moça não deve ter sentido muito. Afinal a natureza – continuo a
imaginar – lhe deu um presente maior do que aquele homem, que não parecia ter
nenhum charme especial (Também isso é imaginação minha!).
Pôr do sol na Baía da Guanabara, a partir da ponte da Ilha da Boa Viagem (foto do autor). |
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