10 de fevereiro de 2016

CASO MÉDICO: HOMEM É MULHER!


Passeava há pouco com meu netinho e, na volta para casa, dei uma olhada rápida nos jornais expostos na banca em frente ao banco. Lá estava estampada uma tragédia pessoal: um homem de 66 anos – um só ano mais novo do que eu – pela primeira vez foi a um médico, o que em si não é propriamente uma tragédia, e descobriu que é mulher.
Ora, como pode ser uma coisa dessas? Confesso que não li a notícia, mas o direito inalienável ao pitaco não exige conhecimento prévio de qualquer natureza, para que se saia por aí falando sobre tudo e todos. Então vou exercê-lo soberanamente aqui.
Voltemos, então, à pergunta: como é que pode uma pessoa passar sessenta e seis anos da vida pensando que é homem, e um médico qualquer, despreparado, formado não se sabe onde, jogar na sua cara que ele é mulher?
- Seu Jeroboão, infelizmente tenho de lhe informar que o senhor não é homem, seu Jeroboão! O senhor é mulher, pelo que pude examinar.
- Mas, doutor, e esse troço pendurado aqui no meio das minhas pernas?
- Isso, seu Jeroboão, é o que a ciência chama de hipertrofia do clitóris. Isso não é um pênis, seu Jeroboão, é um clitóris. E só mulher tem clitóris. E pelo que vejo é uma hipertrofia e tanto. Valha-me Deus! Confesso ao senhor que nunca vi uma hipertrofia deste tamanho neste órgão.
- Mas, doutor, o senhor há de me desculpar a ignorância: e essas bolotas penduradas logo embaixo?
- Outra aberração da natureza, seu Jeroboão. Pelo que a ciência informa, elas não poderiam estar aí, já que tecnicamente o senhor é mulher.
- E o bigodão? E a barba que tenho de fazer sempre?
- Conheço muita mulher barbada, seu Jeroboão. O senhor nunca foi a circo que tem mulher barbada? Pois é! É a mesma coisa. Na minha família, seu Jeroboão, tinha uma tia por parte de pai, uma tia avó, que tinha barba e falava grosso como o senhor. Infelizmente já faleceu, que Deus a tenha!
- Sei não, doutor, acho que o senhor está enganado. Eu nunca fiquei incomodado. Mulher não fica incomodada todo mês?
- Também a ciência explica o seu caso: quando há hipertrofia do clitóris e essas bolotas se desenvolvem desembestadamente, as regras não vêm. Ficam inibidas pelo resto da vida. E de regras passam a exceção, seu Jeroboão!
- Tá na ciência isso, doutor?
- Claro que está, seu Jeroboão! Ou o senhor está achando que sou um charlatão? Passei anos da minha vida estudando o assunto e posso garantir, sem erro, que tudo isto está na ciência.
- E como é que vou explicar à Dulcina, minha mulher, com quem tenho sete filhas, mais os netos que vieram, que eu sou mulher nessa altura da vida, doutor?
- Aí, seu Jeroboão, o problema é seu! É bom o senhor mandar investigar, porque é muito esquisito. Nunca soube que mulher transando com mulher desse em procriação. O senhor, por acaso, não tem um vizinho muito chegado, muito amigo? É bom averiguar, seu Jeroboão, porque aí tem truta.
Jeroboão estava transtornado com a notícia do médico. Pensou que talvez tivesse sido melhor nunca procurar um doutor formado. Lá no seu sitiozinho perdido no alto da serra, vivia muito bem, tratando-se com ervas e plantas.
E agora o que faria? Como falar com Dulcina, mulher de sérios princípios religiosos, que ela esteve casada com outra mulher por mais de quarenta anos. E, pior, que a sua parceira – ele – nunca tinha negado fogo. E também ia tirar umas suspeitas com o compadre Tonhão Campista, vizinho de propriedade e muito chegado à família. Tanto que é padrinho das sete filhas dele. Miserável do compadre Tonhão Campista, pensou Jeroboão lá com seus botões.
Pagou a consulta ao médico, que lhe deu o receituário com reguladores de menopausa e a seguinte recomendação, assim que saía do consultório:
- Seu Jeroboão, e trate também de ir a um cartório trocar esse nome. Que não pega bem uma mulher como o senhor com esse nome de macho.


Imagem em letrasmusicadas.blogspot.com.
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Publicado originalmente em Gritos&Bochichos.

3 comentários:

  1. É Saint-Clair... "há mais mistérios entre o céu e a terra do que a nossa vã filosofia pode imaginar...". Grande abraço.

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  2. A sua imaginação transborda!...
    Tem, mesmo, que ser mulher!

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