13 de outubro de 2014

TERNO MARROM


Esta história se deu na Paróquia do Senhor Bom Jesus, na cidade de Bom Jesus do Itabapoana, nos anos tais, com as pessoas quais, cujos nomes alterei, que não estou aqui para ser processado por calúnia, injúria e difamação. Mas é tão verídica, quanto qualquer outra que já contei ou posso vir a contar, para fazer a crônica da minha cidade natal. Para o bem ou para o mal.
Zé de Lina é corno. Lina é a que o fez ser corno. Mas ele se conforma: não leva para o lado da ofensa pessoal o comportamento deletério da mulher. É corno sem vergonha naquela cara estanhada, bexiguenta, de homem desmoralizado. Lina não chega a ser essa belezura toda. Mas tem ancas largas, cabelo preto comprido penteado em grossa trança, que desce até a vertente da popa. E uns seios estofados de fazer platibanda sobre a barriga já um tanto redonda. E não se esconde atrás de nenhuma dessas posturas falsas, fingindo-se dona de virtudes peregrinas, como estampa sempre A Voz do Povo, o jornal local, ao se referir às damas da sociedade. Conta para as vizinhas suas reinações e a bonomia de Zé, que a tudo assiste impávido, como convém a um corno conformado. Ele não desconfia, mas é a vergonha da rua do cemitério, onde mora. Todos ali sabem de sua condição vexaminosa. E ele continua a jogar sua sinuca e a tomar sua cerveja com os parceiros, com a mesma cara como se fosse o mais amado dos maridos das senhoras de respeito.
Dentre os casos de que detinha a posse, Lina tinha certa predileção por Zinho Mateus e seus mimos. Homem de muitos alqueires de terra e de centenas de cabeças de gado, conduzia seu caso com Lina nas mesas dos bares por onde ia bebericar nas noites de calor, com os amigos parecidos com ele. Na cidade pequena, boa parte da população conhecia a história.
Zé sabia de Zinho, que pensava que o corno fosse inocente. E Zinho tinha até alguma comiseração pelo papel do marido, sem desconfiar de que o sujeito era de caráter mais frouxo que precata velha.
Certo dia, Zinho vinha chegando sem se dar conta de que Lina não pusera na janela da esquina a toalha vermelha, indicativa da ausência do marido. E foi contando os passos quintal adentro, ultrapassando o portão de madeira, que fechou com um golpe seco no trinco de ferro. Até o cachorro de Zé tinha o amante como pessoa das intimidades da casa.
Lina, pega então de surpresa, disse apreensiva para o marido que o amante estava chegando de supetão. Sem tempo para se escafeder dali e deixar o pasto livre para o cavalo pastar, Lino se atirou sob a cama do casal, já que o armário era acanhado demais para sua pessoa.
Com a sem-cerimônia dos amantes estabelecidos, Zinho foi entrando, enquanto Lina corria a se preparar para os embates que se anunciavam, como de hábito. O homem senta-se à beira da cama e começa a tirar as botinas, enquanto fala algo até então impensável para ela:
- Lina, ando com pena do Zé, coitado! Estou botando chifre nele há tanto tempo, que isso já está me deixando com remorso. Estou até pensando em comprar um corte de linho azul e dar de presente para ele mandar fazer um terno novo. Até pago o feitio para ele lá no Branco Alfaiate.
Embaixo da cama, Zé ouve a ponderação daquele que lhe aplica os chifres sobre a cabeça, futuca a mulher, já deitada ao lado com as lingeries do dia, e lhe diz baixinho para não ser ouvido:

- Pede marrom, que azul eu já tenho.

Imagem em mercadolivre.com.br.

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