4 de fevereiro de 2016

AMIZADE

(Aos meus amigos, particularmente a Romeu Pimentel.)

Tenho cultivado amizades, embora não saiba plantar nem um pé de couve. E nisto me sinto um latifundiário. Talvez meu campo seja extenso, porque não há resquício de inimigos a lhe oporem limites. A não ser quando criança, nunca entrei em confronto com o meu semelhante. Nunca cheguei às vias de fato, como os diários sensacionalistas costumam dizer, quando as pessoas saem no braço, dão-se sopapos. Ou, pelo menos, se ofendem verbalmente. Não nasci para isto.
Lembro-me de Ziraldo citando Otto Lara Resende, cujas palavras diziam mais ou menos o seguinte: A natureza não me proveu do sentimento do ódio. Por isso planto amigos a mancheias, para parafrasear o grande Castro Alves. Ainda que não sejam muitos, são intensos, são especiais, são daqueles de se guardarem debaixo de sete chaves, nas palavras de Fernando Brant musicadas por Milton Nascimento. Estou muito citador hoje!
E planto em todos os gêneros, sexos, cores e condições, embora perceba que amigos sãos os que mais próximos estão daquilo que sentimos. Não propriamente do que pensamos. O pensar é livre, cada um tem sua ideologia, sua filosofia. O sentir é mais ou menos semelhante entre os seres, pela própria condição física. Não há tanta diversidade no sentir, quanto no pensar. Por isso é que dou mais valor ao que é menor, para acabar por fazê-lo maior.
Por outro lado, a amizade que planto não é grama. Tem raízes profundas e dá sombras generosas, frutos saborosos, sucos capitosos. Meus amigos são meu orgulho. Quando falo de um amigo, fico até com receio de o outro sentir ciúmes. E aí tento falar sem ostentar as qualidades que vejo naquele, a fim de não melindrar esse. Mas todos estão em meu coração numa escala de entupir artérias.
Aliás a vida sem amigos deve ser – se existir! – uma coisa sem sabor. Ainda que, por momentos, possamos sofrer com o que sofre o amigo, ainda assim é tudo um grande prazer. Até mesmo nisso. Porque, se um amigo está em perigo, o perigo é meu também. Se ele chora, sou capaz de chorar junto. Mas, se ele resolve beber um vinho, aí me emborracho com ele. Um vinho com um amigo é de casta superior, só cultivada no campo da emoção.
Por vezes, fico sozinho em casa, diante do computador, ouvindo uma música, vendo um vídeo, lendo um livro, e sempre me vem à memória os amigos que tenho, alguns especificamente que talvez devessem também compartilhar daquele momento simples, mas cheio de prazer, que consigo tirar das coisas mais corriqueiras. E, nessas ocasiões, fico feliz em saber deles, que andam por esse mundão afora, levando suas vidas, curtindo os seus, fazendo valer sua presença na existência, e isto me dá um conforto muito grande. Às vezes, até um orgulho infantil.
Os meus amigos são soberbos! Não que sejam orgulhosos, cheios de vaidade. Não que se sintam melhores que os outros. Superiores aos demais. Mas são os amigos que trago no meu mais profundo sentimento. Aqueles que estão soberanos na minha estima. E disso não abro mão, nem faço economia no adubo.
Salve o amigo! Viva meus amigos!

Árvore em Itaocara-RJ; 1/12/2013 (foto do autor).

8 comentários:

  1. Com razão o Saint-Clair, esse coração enorme e personificado. Ser amigo é esperar por mais um dia, como em todos os dias, e reter o calor, na espera, até mesmo depois que o sol declina.

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  2. Viva os amigos, Saint-Clair... os antigos, os novos, os de sempre, e os que hão de vir. Grande abraço.

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  3. Belissimo texto. Me emocionei ao le-lo. Vc expressou, de uma forma tão simples e singela, todo um sentimento puro da amizade. Me senti também autor dessas palavras, pois, assim como VC, sinto tudo isso pelos meus poucos amigos. Abraços.

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    1. Somos feitos da mesma matéria, somos bonjesuenses sobretudo, amigok!

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  4. Prazer em ser sua amiga, ainda que virtual!...
    Mas ainda espero vê-lo, aqui em Aveiro... e tornar-me amiga, mesmo!

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    1. E dizer que já aí estive em 2003. Mas hei de voltar. Portugal nos recebe de coração aberto. Um abraço e obrigado pela leitura e comentários.

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