Mesmo que você seja um preguiço contumaz – e não vou aqui
enumerar alguns que me conheço –, sempre terá o que fazer do ponto de vista
linguístico. Nossa língua nos provê de um bom número de expressões do fazer
que, propriamente, podem não produzir nenhuma obra que se preze, mas, ao
contrário, servirão para expressar muitos e variados conceitos. Aliás,
conceitos pertinentes a respeito das coisas do dia a dia (Até hoje não concordo
muito com a reforma ortográfica que suprimiu o trema e escorraçou o hífen de
muitas palavras de forma inexplicável.).
Consegui arrolar algumas delas para a sua apreciação, caro
leitor.
Aí vão.
Fazer a vida – Trabalhar; exercer
certo ramo de atividade; sair do estado de inatividade para o de produtividade.
Fazer água – Romper-se o casco, com a consequente entrada de
água na embarcação. Produzir resultado pífio ou aquém da expectativa; resultar
uma ação em consequência desprezível.
Fazer barulho – Alardear; manifestar-se em altos brados;
propagar; tornar público.
Fazer beiço/beicinho – Chorar; começar a chorar; fingir
chorar a fim de comover o outro.
Fazer bobice – Fornicar; manter relações sexuais. Agir de
forma debochada, ou com brincadeira. / Também na forma popular interiorana: fazer bobiça.
Fazer cara de paisagem: Fingir distanciamento do que
acontece; mostrar-se alheio ou indiferente à situação.
Fazer caminho – Viajar; ir em busca de realizar algo; sair.
Procurar um rumo na vida.
Fazer cera – Demorar propositadamente a fazer algo, na
intenção de ganhar tempo; remanchar; retardar a execução de uma tarefa. No
futebol, demorar na reposição da bola em jogo, a fim de ganhar tempo, quando o
próprio time está com o placar favorável.
Fazer chacota – Zombar; tratar com desconsideração ou
desprezo.
Fazer comichão – Instigar; incentivar; motivar.
Fazer (cu) doce – Colocar-se acima da situação, fingindo não
se interessar por aquilo que acontece; fingir distanciamento; fingir
superioridade.

Fazendo doce, literalmente (em guiadicas.net).
Fazer das tripas coração – Transformar, pelo trabalho
exaustivo, algo negativo em positivo. Produzir bom resultado, a partir de dados
negativos.
Fazer de conta – Fingir; fabular.
Fazer feio/ bonito – Realizar algo com bom/mau resultado;
errar/acertar na execução de uma tarefa.
Fazer figa – Tentar precaver-se de maus resultados; fingir
não dar importância a algo.
Fazer figura/cena – Fazer pose; fingir um estado de espírito;
mostrar-se; pavonear-se.
Fazer filho – Engravidar alguém (o homem); engravidar-se (a
mulher).
Fazer firula – Expressão oriunda da linguagem do futebol:
tentar ou executar jogada de efeito bonito, mas sem aplicação prática na
partida. Fazer algo sem praticidade, apenas na tentativa de aparecer para o
outro.
Fazer gato e sapato – Tratar de maneira irresponsável
reiteradamente; abusar.
Fazer mal – Manter o homem relações sexuais com mulher
inexperiente, normalmente virgem.
Fazer merda/cagada – Fazer algo que produza resultado
negativo, por imperícia ou precipitação; fazer algo malfeito, inútil ou sem bom
acabamento.
Fazer mundo – Viajar; viajar sem roteiro pré-programado; sair
em busca de realizar algo; viver vida errante.
Fazer o diabo – Agir de forma abusada e excessiva. Exercer
muitas atividades; fazer muitas coisas.
Fazer onda – Mostrar-se superior diante do outro em
determinada situação. Também se diz tirar
onda.
Fazer ouvidos de mercador – Fingir que não ouve algo que é
dito, a fim de não se obrigar a reagir.
Fazer piada/troça – Zombar; não levar a sério um assunto;
ridicularizar.
Fazer pouco – Desconsiderar; levar em pouca conta ou
consideração.
Fazer presença – Estar presente; comparecer; estar em
determinado lugar ou situação, sem se comprometer com o que ocorre.
Fazer-se ao mar – Partir em viagem marítima; navegar.
Fazer-se de morto – Não participar de determinada atividade
ou opinião, para não se compromete; omitir-se.
Fazer-se de vítima – Aparentar inocência para fugir à responsabilidade
de sua própria ação; dissimular.
Se você, leitor, quiser aplicar algumas dessas expressões a
alguém que conheça, da vida pública ou privada, esteja à vontade. Não sou
proprietário delas; é a língua que nos provê deste vasto repertório de palavras
e expressões de que podemos dispor, para exprimir nosso conceito do mundo que
nos cerca. E pelos sete lados, como numa aposta do jogo de bicho.
Até a próxima, que tenho mais o que fazer!
----------
Publicado originalmente em Gritos&Bochichos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário