20 de janeiro de 2016

FAZER OU NÃO FAZER


Mesmo que você seja um preguiço contumaz – e não vou aqui enumerar alguns que me conheço –, sempre terá o que fazer do ponto de vista linguístico. Nossa língua nos provê de um bom número de expressões do fazer que, propriamente, podem não produzir nenhuma obra que se preze, mas, ao contrário, servirão para expressar muitos e variados conceitos. Aliás, conceitos pertinentes a respeito das coisas do dia a dia (Até hoje não concordo muito com a reforma ortográfica que suprimiu o trema e escorraçou o hífen de muitas palavras de forma inexplicável.).
Consegui arrolar algumas delas para a sua apreciação, caro leitor.
Aí vão.
Fazer a vida – Trabalhar; exercer certo ramo de atividade; sair do estado de inatividade para o de produtividade.
Fazer água – Romper-se o casco, com a consequente entrada de água na embarcação. Produzir resultado pífio ou aquém da expectativa; resultar uma ação em consequência desprezível.
Fazer barulho – Alardear; manifestar-se em altos brados; propagar; tornar público.
Fazer beiço/beicinho – Chorar; começar a chorar; fingir chorar a fim de comover o outro.
Fazer bobice – Fornicar; manter relações sexuais. Agir de forma debochada, ou com brincadeira. / Também na forma popular interiorana: fazer bobiça.
Fazer cara de paisagem: Fingir distanciamento do que acontece; mostrar-se alheio ou indiferente à situação.
Fazer caminho – Viajar; ir em busca de realizar algo; sair. Procurar um rumo na vida.
Fazer cera – Demorar propositadamente a fazer algo, na intenção de ganhar tempo; remanchar; retardar a execução de uma tarefa. No futebol, demorar na reposição da bola em jogo, a fim de ganhar tempo, quando o próprio time está com o placar favorável.
Fazer chacota – Zombar; tratar com desconsideração ou desprezo.
Fazer comichão – Instigar; incentivar; motivar.
Fazer (cu) doce – Colocar-se acima da situação, fingindo não se interessar por aquilo que acontece; fingir distanciamento; fingir superioridade.
Fazendo doce, literalmente (em guiadicas.net).
Fazer das tripas coração – Transformar, pelo trabalho exaustivo, algo negativo em positivo. Produzir bom resultado, a partir de dados negativos.
Fazer de conta – Fingir; fabular.
Fazer feio/ bonito – Realizar algo com bom/mau resultado; errar/acertar na execução de uma tarefa.
Fazer figa – Tentar precaver-se de maus resultados; fingir não dar importância a algo.
Fazer figura/cena – Fazer pose; fingir um estado de espírito; mostrar-se; pavonear-se.
Fazer filho – Engravidar alguém (o homem); engravidar-se (a mulher).
Fazer firula – Expressão oriunda da linguagem do futebol: tentar ou executar jogada de efeito bonito, mas sem aplicação prática na partida. Fazer algo sem praticidade, apenas na tentativa de aparecer para o outro.
Fazer gato e sapato – Tratar de maneira irresponsável reiteradamente; abusar.
Fazer mal – Manter o homem relações sexuais com mulher inexperiente, normalmente virgem.
Fazer merda/cagada – Fazer algo que produza resultado negativo, por imperícia ou precipitação; fazer algo malfeito, inútil ou sem bom acabamento.
Fazer mundo – Viajar; viajar sem roteiro pré-programado; sair em busca de realizar algo; viver vida errante.
Fazer o diabo – Agir de forma abusada e excessiva. Exercer muitas atividades; fazer muitas coisas.
Fazer onda – Mostrar-se superior diante do outro em determinada situação. Também se diz tirar onda.
Fazer ouvidos de mercador – Fingir que não ouve algo que é dito, a fim de não se obrigar a reagir.
Fazer piada/troça – Zombar; não levar a sério um assunto; ridicularizar.
Fazer pouco – Desconsiderar; levar em pouca conta ou consideração.
Fazer presença – Estar presente; comparecer; estar em determinado lugar ou situação, sem se comprometer com o que ocorre.
Fazer-se ao mar – Partir em viagem marítima; navegar.
Fazer-se de morto – Não participar de determinada atividade ou opinião, para não se compromete; omitir-se.
Fazer-se de vítima – Aparentar inocência para fugir à responsabilidade de sua própria ação; dissimular.
Se você, leitor, quiser aplicar algumas dessas expressões a alguém que conheça, da vida pública ou privada, esteja à vontade. Não sou proprietário delas; é a língua que nos provê deste vasto repertório de palavras e expressões de que podemos dispor, para exprimir nosso conceito do mundo que nos cerca. E pelos sete lados, como numa aposta do jogo de bicho.
Até a próxima, que tenho mais o que fazer!
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Publicado originalmente em Gritos&Bochichos.

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