Tenho tido chapéus e boinas há algumas
décadas. Não sou uma pessoa antiga, nem saudosista, embora já entrado em anos,
para usar uma expressão eufemística que me alivie a proximidade dos setenta,
mas que gosta deste complemento do traje masculino, caído em desgraça, pelo
menos, desde a década de 50 do século XX.
Durante bom tempo fazia uso esporádico ou
recreativo desses apetrechos, em determinadas circunstâncias. Contudo há cerca
de uns cinco anos, comecei a usar chapéu cotidianamente, a fim de tentar fugir
das recomendações da minha dermatologista, que me exigiu filtro solar, até sob
céu nublado anunciador de chuva. Na oportunidade em que ela me receitou o
creme, manifestei meu desagrado em seu uso dada a oleosidade da minha pele.
Ela, então, para me deixar sob sua tutela permanente – não poderia jamais em
minha vida de branco azedo prescindir dessa proteção – me ofereceu amostra
grátis de um apropriado, que só usei no primeiro dia. Assim optei pelo chapéu. É
mais elegante – posso até pretender ficar mais bonito, coisa, aliás, difícil de
conseguir – e não emplastra o rosto com aquela película gosmenta.
Entretanto devo dizer que fico parecendo
um estranho no ninho. A devastadora maioria da população masculina prefere até
mesmo uma calva reluzente – ainda não atingi este nível – a um disfarce de tal
arquitetura. É verdade que, ao me olhar no espelho, no quesito beleza, não vejo
diferença alguma nessa minha estampa que, à medida que o tempo escoa no
calendário, vai ficando mais decadente. Porém o que se há de fazer? É isto ou
morrer subitamente. Prefiro envelhecer.
Assim, a cada dia, ao sair, encastoo no
alto da cabeça um dos meus vários chapéus de panamá comprados por aí. E ponho
na cabeça – então lá dentro – que estou protegido de todas as gamas de raios
emitidos pelo Astro Rei, de modo a evitar um possível câncer de pele, vez que
nasci branquelo num país tropical, abençoado por Deus, e o resto o prezado leitor
sabe.
Caso contrário, se é noite, ponho uma
boina, um boné de aba curta, um chapéu de feltro – tenho mesmo um argentino
próprio para dançarino de tango, apesar de não dar um passinho que seja nem de
bolero – e saio para o encontro com amigos, a tomar um vinho, numa noite amena,
o que tem sido cada vez mais difícil na cidade grande.
Algumas vezes, no entanto, tenho de dar
explicações sobre a excrecência que levo alguns centímetros acima de minha
pessoa e, para não dizer que pretendo ficar mais bonito, ou simplesmente que é
um gosto maior que três vinténs, dou a desculpa de que estou seguindo
recomendação médica, para me proteger das emissões de raios ultravioletas e
quejandos. A explicação é aceita de muito bom grado. Todos morrem de medo de
câncer.
Relativamente ao uso desse acessório, minha
dermatologista me disse certa vez, quando a informei desta minha opção, que,
num país ensolarado como o nosso, ele jamais deveria ter sido deixado de lado.
E isto me remete a certas fotos que tenho
na memória sobre acontecimentos públicos nas grandes cidades do mundo, nas
quais todos os homens, quase sem exceção, estão de chapéu. Mesmo na minha
infância e juventude em Carabuçu, do final dos anos 40 até meados dos 60, era
comum que vários homens ainda o usassem: os que trabalhavam na roça, sempre; os
da vila, já nem tanto. Há uma fotografia na família em que está registrado o
valoroso esquadrão do Liberdade Esporte Clube, da época em que meu pai brilhava
na extinta ponta-esquerda. Lá está todo o time em pose da época e, atrás, de
pé, os dirigentes do clube, todos indefectivelmente de chapéu, inclusive meu
avô Chico Albino, numa elegância inusual atualmente.
Assim, mesmo não me considerando saudosista
ou antigo – tenho na minha cabeça de que o gosto pelo rock me salva desta pecha
–, uso chapéu como um exemplar saído das fotografias de antigamente, seguindo
uma tradição que não mais existe nos dias de hoje.
Chapéus (foto do autor). |
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Publicado originalmente em Gritos&Bochichos, em 17/6/2015.
Contra os "raios" ou não, também apoio o uso do chapéu: torna o homem mais elegante. De alguns, como eu, esconde a calva. Passei a adotar, de uns dias para cá, uma boina à la Guevara e aguardo, ido ao Mercado Livre, por um Kipá judaico.Claro, menos por questões políticas ou apóstatas e mais por estéticas, mesmo. Hehe!
ResponderExcluirAguardá-lo-ei de kipá!
ExcluirAssim como o uso do chapéu, muito elegantes suas reflexões. Também o adotei! E minha explicação é a mesma que a sua: conveniência médica. Grande abraço! (e quanto ao vinho em cidade grande... ah, o vinho... ainda passo por aí para uma taça... para falarmos de crônicas, poesia, escritores, música, e pelo simples prazer de podermos celebrar a vida).
ResponderExcluirElias, quando vier, avise-me para o vinho. Abraços.
ExcluirTambém gosto de ver um homem com chapéu! E não sou tão antiga assim...
ResponderExcluirFui eu que convenci o Alfredo a comprar o panamá!
Parece que ficamos mais elegantes. Abraços.
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