Estive
em Tiradentes, neste último fim de semana, retocando meu colesterol.
Vou
sempre lá com a Jane e amigos. Desta vez, em petit comité, com Rogério e
Laura. Mas já fomos em bando de mais de vinte amigos. Nunca há erro. Nunca há deslizes
ou equívocos, e cada vez é sempre inusitada.
Tiradentes
deve ser o meu destino preferido de viagem.
Até mais que Paris, porque mais acessível.
Já
disse alhures que devo ter uma alma colonial, inconfidente; mineira, enfim. Ou
não há outra explicação para esta identidade tão grande. Mesmo para mim que não
acredito em almas. Deste ou do outro mundo. Mas é que há uma sintonia fina, em
HD, sei lá, com a cidade. E, reparem, não tenho o mínimo interesse em morar lá:
aquelas pedras do calçamento destruiriam o que ainda sobra de sadio em meus
joelhos, já tão propensos à artrose.
Mas
vou lá para retocar meu colesterol. Que meu endocrinologista não me leia!
Contudo continuo tomando a droga que ele prescreve e entro de sola - ou melhor,
caio de boca - em torresmos, costelinhas, lombinhos, linguiças, tutus, feijões
tropeiros, movidos a cerveja e pinga. Que ninguém é de ferro! E, à noite, há
libações enológicas de muito bom gosto, dentro dos limites que a economia nos
impõe. Porque, se pobres ou minguados de pecúnia, somos soberbos em bom gosto.
A
vida sem colesterol deve ser muito sem graça. Desde que nasci, no interior do
Rio de Janeiro – em Carabuçu, para ser mais preciso –, ando de braços com o
colesterol. Lá somos – ou éramos, pelo menos – criados à base de carne de porco
e seus embutidos magníficos, o chouriço e a linguiça no topo da lista. Ainda
hoje, em Bom Jesus do Norte, onde mora, minha mãe mantém nacos de porco
mergulhados em gordura. Nunca falta carne numa emergência.
Aí
vem a ciência médica e nos exige exames disso e daquilo, vampirismo em sangue
alheio, e olha lá a taxa de colesterol gritando contra os abusos de dezenas de
anos e um sedentarismo confortável. A gente se assusta. Eu, sem querer afrontar
demais o progresso da ciência, me resigno a cuidar das (mal)ditas taxas, a fim
de não sofrer um entupimento nas vias sanguíneas e fechar o paletó antes do
tempo.
Entretanto
não abro mão dos prazeres que aprendi a cultivar desde a mais tenra idade,
quando era testemunha da matança de porco empreendida por minha saudosa avó
Maína ou por minha tia Alda, que ainda está entre nós e não me deixa mentir.
Devo
confessar que não tinha pena do bichinho, pelo muito de delícia que ele nos
proporcionava. Ainda hoje também não tenho. Sobretudo quando se vai a Minas
Gerais, onde o porco é o rei da culinária.
E em
Tiradentes, no Bar do Celso, por exemplo, local a que nunca deixamos de ir,
todas as vezes que chegamos à cidade, entramos na orgia gastronômica tão
mineira, tão brasileira e tão carregada no colesterol. Mas quem há de resistir,
tendo essa minha história gourmand, esse pedigree caipira que come carne sem
constrangimentos? Não porque não tenha pena do bichinho, mas porque o ser
humano só come outro ser vivo, como a couve, por exemplo, tão esquecida nesses
argumentos politicamente corretos.
Voltei
com o colesterol lubrificado. E a alma mineira – se é que ela exista – retemperada. No alho, na cebola, na pimenta-do-reino e no alecrim.
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Imagem em gastronomirian.blogspot.com.br. |
(PS: Em Miracema, utilizando o modem da Vivo, é impossível conexão decente com a Internet. Por isso, esta postagem vai sem ilustração. Tão logo seja possível, ela aqui estará.
PS2: Incluí a imagem, como podem ver aí.)