4 de outubro de 2011

O TRAVESSEIRO EMPAPADO

Imagem em simplesmenterhanna.blogspot.com.

A honra da família, aquela película que faz ploc!, já tinha entregue ao namorado, com todo o prazer, mas que ninguém soubesse. Ele, prático de farmácia, a cara espinhenta dos rapazes que andam tendo caso de amor com a própria mão. Além, é claro, de ficar bebendo as poções miraculosas que imaginava criar para salvar o bicho homem do fantasma da impotência.
O namoro era firme, arrochado, chamado em baixo, feito fole de sanfona em dia de festa junina. A família, de algumas posses – vissem as vacas pastando, o milho embonecando, a casa bem assentadinha no terreno plano –, era do contra. Coisa de família endinheirada. Além do que, a menina era uma gracinha, areia demais para o caminhão do futuro farmacêutico.
Como todo romance proibido, esse também foi empurrado para um desfecho mais ou menos conhecido. O rapaz convidou a namorada para que fugissem numa noite de lua nova. Ninguém os veria. Tudo bem! Tudo certo! Te espero com a roupa arrumada. E ficou ela lá sonhando com seu príncipe farmacêutico chegando num fogoso corcel branco, a custo dominado por sua perícia de cavaleiro. Ela, num vestido branco imaculado, montaria na garupa do cavalo, mãos na cintura do herói, os dois partindo, numa marcha batida, para longe, para a felicidade.
Na noite dada, o pio da coruja combinado como senha, ela pula a janela, com a trouxinha na mão, o vestido branco, uma flor de laranjeira emoldurando seu brejeiro sorriso moreno, e dá de cara com o namorado montado na velha bicicleta da farmácia, oferecendo-lhe o bagageiro como assento. Desiludida em seu sonho, mandou o namorado às favas, às poções e aos unguentos, que ela, nem morta, embarcaria em tal veículo, terminado seja o namoro e passe muito bem!
Voltou ao quarto pela janela e empapou o travesseiro com suas generosas lágrimas de menina romântica.

2 comentários:

  1. Eh, eh... pode até ser pobre e feio mas, não cumprir com as exigências do sonho de menina aí não há amor que aguente. Excelente enredo, Saint-Clair, um desfecho inesperado para aqueles que não mantém fidelidade ao sonho.

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